‘’Processo, processo, processo’’.
É com essa frase do personagem do dia, Renato Paiva, que dou início a essa crônica de hoje. Eu sou um torcedor da ‘Geração Fast’, a mais sofredora geração de torcedores do Bahia. Somos como cachorros que apanharam na cabeça e ficaram com medo e na defensiva até para carinhos. Crescemos ouvindo nossos pais contarem sobre os grandes momentos do Bahia, mas a gente… Bem, as nossas histórias são muito mais modestas. Inebriados por essa ansiedade, afinal, também queremos contar para nossos filhos sobre a grandeza do Bahia e fabricar uma nova geração de torcedores mais felizes do que fomos até o presente momento. E também queremos ser felizes.
Mas, para atingirmos resultados diferentes, precisamos tentar coisas diferentes, correto? Nem sempre. No futebol, existem decisões onde a repetição gera resultado e decisões que só dão certo se houverem mudanças. O macete da boa gestão é saber quando mudar ou quando conservar. Isso vai desde a titularidade de um jogador até a demissão de um treinador. Para isso, podem ser utilizadas várias ferramentas: indicadores de desempenho, análises técnicas, etc. O barulho do torcedor, a pressão da imprensa e as duas coisas combinadas devem estar em último lugar nos critérios de tomada de decisão. Isso se dá porque decisões devem ser tomadas com a cabeça e não com o coração. A emoção tem que ser monopolizada pelo torcedor.
E tem outra coisa que gostaria de pontuar: ‘’a herança do futebol’’. Essa frase é de outro português e este, por sua vez, é para mim o melhor treinador do século XXI (até o momento). Que me perdoe Pep Guardiola, Ancelotti, Jurgen Klopp, Zidane e companhia limitada, mas, José Mourinho, o autor da frase, conseguiu resultados expressivos em ambientes onde menos se espera. E quando ele soltou esta frase, o contexto era parecido com o que vivemos. O Manchester United acabara de ser eliminado de uma competição europeia ante o Sevilla e havia uma pressão da imprensa e torcida perante seu trabalho. José, com sua eloquência costumaz, soltou:
“Eu digo aos torcedores que eles são os torcedores e têm o direito de ter suas opiniões e reações, mas há algo que eu costumo chamar de “herança futebolística”. […].Então, em sete anos, com quatro treinadores diferentes, uma vez não se classificou para Europa, em duas ficou fora na fase de grupos e na melhor foi às quartas de final. Isso é “herança futebolística”. […]. Significa que quando você começa o processo, você está aqui, ali ou lá (aponta para baixo e cima). É herança.’’
(Segue no link fala completa).
Qual a herança futebolística do Bahia? Vamos analisar um recorte de 10 anos para cá a quantidade de treinadores que tivemos, quantas vezes trocamos de técnico, quantas vezes deu resultado a troca de técnico, etc.:
Ao todo (somando Técnicos efetivos e interinos), o Bahia foi treinado por 26 técnicos diferentes nos últimos 10 anos. Dá quase 2 trocas de técnicos por temporada (2023 ainda está em andamento, nota importante), ou seja, 3 técnicos diferentes por ano (incluindo interinos). Quanto a técnicos efetivos, o Bahia teve 22 treinadores. Nesse período, alguns técnicos treinaram o Bahia por mais de uma oportunidade: Guto Ferreira e Enderson Moreira. Tivemos também Dado Cavalcanti que treinou o time sub-23 em 2019 e um ano depois foi contratado como técnico do time principal. Tivemos também a tentativa de lançamento de dois técnicos no mercado da bola: Charles e Preto Casagrande. Até a chegada de Renato Paiva, tivemos também dois técnicos estrangeiros: Dabove e Bruno Lopes (sub-23 e técnico interino).
Vamos aos padrões: Quanto as demissões no Bahia, em 7 vezes o destrato ocorreu nos primeiros seis meses e em 11 oportunidades a troca de técnico ocorreu na reta final do campeonato brasileiro. A pergunta que fica é: quantas vezes essas trocas fizeram o Bahia atingir o seu objetivo na temporada? Somente em cinco trocas de técnico o Bahia conseguiu algum tipo de resultado positivo. Mas, quais resultados positivos foram esses? Dois acessos (um com Guto e outro com Barroca) e manutenções na Serie A com Cristovão Borges, Dado Cavalcanti e Paulo César Carpegiani. É muito pouco para o Bahia, correto?
E qual a herança que ficou com todas essas interrupções de trabalho? O que o Bahia aproveitou de cada treinador? Qual identidade o Bahia adquiriu? Nenhuma. Nada. Aprofundemos a análise: Quantas vezes o Bahia trocou de um técnico que jogava de uma forma e trouxe outro que jogava de uma forma completamente diferente? Quantas vezes sequer conseguimos definir a forma que um treinador gostava de jogar no Bahia? Essa é a herança do futebol do Bahia. E eu nem quero falar de divisão de base nessa crônica de hoje porque fica vexatória a herança que o Bahia pré-SAF deixou.
E aí, caro torcedor, você que votou sim pra SAF, sim para o Grupo City, por qual motivo você aceitou negociar o controle do futebol do Bahia com um grupo estrangeiro? Eu escolhi porque eu queria que o Bahia fizesse coisas diferentes. E uma das coisas que eu mais queria naquela fatídica tarde de Sábado era que o Bahia se tornasse um time com modelo, filosofia, identidade e estilo de jogo definidos. Mas, para isso, é preciso pagar o preço. É preciso ter paciência com o trabalho. É preciso ‘’deixar o homi trabalhar’’. Não adianta clamar pelo retorno de Guto Ferreira, se tornar caixa de ressonância de gente mal intencionada, pegar ranço ou clamar pela demissão do técnico. E não falo isso porque o Bahia venceu duas partidas no brasileirão ou vêm bem numa Copa do Brasil, falo porque o trabalho deve ser levado em conta antes dos resultados para balizar uma decisão. Seja pela manutenção ou pela quebra de contrato.
É claro que nós, adeptos, reagiremos a todos os resultados, ficaremos revoltados, bradaremos, vaiaremos, sofreremos e nos sentiremos ludibriados, afinal, somos munidos de paixão, somos capazes de lotar o estádio num dia de chuva e com greve de ônibus, temos todo o direito de clamar, mas, é bom termos consciência que cada gol sofrido, cada derrota, cada triunfo, cada jogadinha bonita, cada queimada de língua, cada momento que vivermos com o Bahia, fará parte do processo. E este processo é contínuo.
Tomando todas as precauções para não fazer a Shakira e ser enganado por um catalão, comprei a ideia de Ferran Soriano: proponho que fiquemos juntos. Sempre. Torcida, clube, jogadores e comissão técnica. Vamos nos fechar. Como diria outro grande técnico, Doc Rivers, ‘’eu sou porque nós somos’’. Que tal se passarmos a dar menos ouvidos a gente que não quer ver o nosso bem e fizermos nossas críticas sem querer ver os profissionais pelas costas ? Que tal se abraçarmos de corpo e alma o processo vivenciarmos as etapas uma de cada vez? Vai dar certo, eu confio.
BBMP !
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