Alguns amigos e colegas de trabalho me têm instado a emitir opinião sobre os acontecimentos do último sábado e sobre a situação deplorável vivida pelo Bahia nesse momento. “Como é que é, não vai escrever nada? Não vai dizer o que está achando de tudo isso? Não vai dizer o que deve ser feito? Não vai apontar os culpados? Não vai indicar um caminho?”
Quisera ter tal clarividência e tal poder. Invejo imensamente os que têm respostas para essas e outras questões substantivas. Hesitei bastante em escrever, pelo simples fato de não ter opinião clara, definida, refletida (nem sobre isso nem sobre o efeito do buraco da camada de ozônio nas bocas de caranguejo). O estado de perplexidade em que me encontro é tal que já nem tenho certeza da real existência de um time chamado Bahia. Como, então, emitir opinião?
O clamor de meus amigos revela uma característica interessante que tem permeado a sensação de desamparo e desesperança da torcida tricolor: o messianismo. Nesses momentos em que as forças terrenas parecem insuficientes para resolver adequadamente nossos problemas, para suprir nossos anseios de colocar as coisas nos eixos, somos levados a ansiar por alguém que nos conduza ao Jardim do Éden, por “salvadores da pátria”, por soluções mágicas.
Foi esse messianismo que conduziu Petrônio Barradas à presidência do Bahia. Mas não foi necessariamente dele a idéia de que só a corrente política a que pertence era a única e transcendental saída, mas sim do seu mentor e eminência parda Paulo Maracajá, segundo minha humilde e atônita opinião. Lembro-me de Petrônio declarando, à época das últimas eleições no Bahia: “Eu não podia deixar que um bando de aventureiros viesse a dirigir o Bahia!”. Falava do seu oponente, o candidato Fernando Jorge e dos que o apoiavam (incluindo o jornalista Nestor Mendes). Era Petrônio falando, mas me pareceu que ele estava dublando Maracajá.
Não conheço pessoalmente nenhum dos citados, que aqui só estão nomeados por serem figuras públicas, assim como são públicos os fatos relatados. Não sei se o engenheiro Fernando Jorge e seus companheiros de chapa seriam um fiasco ou um sucesso na condução dos destinos do Bahia. Sei que eles tinham um projeto (ambicioso, por sinal) e que Petrônio não tinha projeto nenhum, a não ser impedir que um “falso Messias” concorrente ocupasse o lugar que lhe era reservado por direito divino. Quer dizer, eu acho que na verdade era Maracajá quem pensava assim e, devido ao seu impedimento legal de se candidatar, induziu Petrônio a aceitar a tarefa messiânica de pegar a bananosa, não lhe dando nem a chance de dizer: “É ruim, hein?” ou “Véi, afasta de mim esse cálice!”
Depois da política de pés-no-chão de Marcelo Guimarães, que se revelou como pé-na-cova, chegamos à política da administração da escassez sem criatividade de Petrônio, que no último sábado se mostrou insuportável, intolerável. Não vou entrar no mérito da correção nem da eficácia do ato da torcida invadindo o campo. Não se tratou de uma atitude pensada, planejada, calculada. Aquilo lá foi um ato de desespero. Foi puramente passional. E não queiram achar razão na paixão, porque até a Justiça costumava reconhecer atenuantes em crimes passionais, por conta da “privação dos sentidos”. A torcida já estava com os testículos repletos. Já não via mais ressonância nas vaias, nos desabafos em microfones. Resolveu agir diferente. Como diz a piada, quando ela se viu diante do precipício, deu um passo à frente.
Agora fazer o quê? Qual o caminho a seguir? Como eu disse no início, não tenho as respostas. Tenho a vaga idéia de que o Bahia precisa ser reinaugurado, refundado, reinicializado, tomar um Ctrl+Alt+Del. E na falta melhores respostas, na falta de palavras minhas, originais, recorro ao texto do poema Cântico Negro, do português José Régio, que me lembro costumava ser declamado com incomparável maestria e emoção pelo falecido ator Paulo Gracindo:
” Vem por aqui – dizem-me alguns com olhos doces,
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom se eu os ouvisse
Quando me dizem: “vem por aqui”!
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos meus olhos, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali…
…Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: “vem por aqui”!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou…
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou,
– Sei que não vou por aí.”
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