Gabriel Garcia Márquez, meu primo distante colombiano (Marques é o meu sobrenome paterno) foi um grande escritor colombiano, do gênero realismo fantástico. Uma de suas obras mais icônicas foi Cem Anos de Solidão. Outra, a que dá título a esta crônica.
“O Amor…” é ambientado na Colômbia e no Caribe do Século XIX; e conta a história de um desses triângulos amorosos entre dois homens e uma mulher, em meio à terrível doença que dizimou milhares, quiçá milhões de pessoas na Colômbia (então em guerra) e países adjacentes. Volta e meia a tal moléstia dá uma descida e vem parar por aqui, conforme ocorrido no começo dos anos 1990.
Uma das cenas da referida obra literária ocorre quando Fermina e Florentino, enamorados, navegavam em um navio, no leito de um rio em meio a dezenas de corpos boiando, vitimados pela tétrica doença ou em razão do conflito ora em curso. Márquez descreve o acontecimento assim:
O rio ficou turvo e se foi estreitando cada vez mais, e em vez do emaranhado de árvores colossais que assombrara Florentino Ariza na primeira viagem, havia planícies calcinadas, destroços de selvas inteiras devoradas pelas caldeiras dos navios, escombros de povoados abandonados de Deus, cujas ruas permaneciam inundadas mesmo nas épocas mais cruéis da seca. Durante a noite não eram despertados pelos cantos de sereia dos peixes-boi nas pontas de areia, e sim pela baforada nauseabunda dos mortos que passavam boiando rumo ao mar. Pois já não havia guerras nem pestes mas os corpos inchados continuavam passando. O capitão foi sóbrio por uma vez: “Temos ordens de dizer aos passageiros que são afogados acidentais.” Em lugar da algaravia dos louros e do escândalo dos micos invisíveis que em outros tempos aumentavam o bochorno do meio-dia, só restava o vasto silêncio da terra arrasada.
Ao final da estória, ao final da terrível viagem, onde “fizeram amor” pela primeira vez, o casal chega a um porto seguro. De acordo com a narrativa:
O comandante olhou Fermina Daza e viu em suas pestanas os primeiros lampejos de um orvalho de inverno. Depois olhou Florentino Ariza, seu domínio invencível, seu amor impávido, e se assustou com a suspeita tardia de que é a vida, mais que a morte, a que não tem limites.
— E até quando acredita o senhor que podemos continuar neste ir e vir do caralho? — perguntou. Florentino Ariza tinha a resposta preparada havia cinqüenta e três anos, sete meses e onze dias com as respectivas noites.
— Toda a vida — disse.
Este é o Esporte Clube Bahia, em meio a idas e vindas, tormentas e dissabores, em meio ao vale da sombra da morte, com os urubus de Canabrava à espreita. Quando tudo parecia perdido, eis que Cauly finca raízes na série A, e olha para o alto, contemplando os ramos de folhas, flores e frutos de esperança em dias melhores.
Entrementes, Rogério, sem qualquer mise-em-scène, confessa: “Tu és o meu refúgio e a minha fortaleza, o meu Deus, em quem confio”, inspirado pelo Salmo 91.
Deus é o nosso refúgio e o nosso Fortaleza. O gol espírita de Lucero, após falha do goleiro do Santos, multiplicou os peixes da esperança na Fazendávila, rebaixando o time da Vila em detrimento do Bahia. Arthurzinho estava certo: foi Deus quem quis. Graças a todos os Santos e ao dia iluminado de Lucero, a nossa Luz, a nossa salvação.
E assim continuaremos, entre sortilégios, milagres e raudineis. Igual nos tempos do cólera: vivendo entre grandes cagadas. Eternamente.
Saudações tricolores e boas festas a todos!
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