Há tempos venho amadurecendo a idéia de escrever nesse espaço tão conceituado e apreciado pelos fanáticos tricolores. Desde meus primeiros acessos, percebi claramente que aqui a torcida teria o seu canto, de forma bem democrática. E foi isso que me deixou mais tranqüilo. Ter a certeza de ser ouvido foi fator primordial para que eu continuasse pensando em um dia escrever aqui no site.
Apesar de ter amizade com os responsáveis pelo site oficial do Bahia, minha voz não ecoava. Cheguei a mandar alguns textos, mas todos foram barrados. A justificativa era sempre a mesma, só que não me convencia. Até que cansei e parei de incomodá-los.
Hoje, depois de um convite de meu amigo Marcelo Barreto, resolvi aceitar o desafio de ser colunista do site. Só tenho a agradecer a ele e a todos que mantêm vivo esse espaço tão democrático.
XXX
Amanheci nostálgico, fruto de um sonho que tive hoje. Alguns dizem que sonhos são prenúncios do que pode vir pela frente, outros, acham que é a realização de algo que nunca vai acontecer. E ainda tem aqueles que afirmam que é a mistura de ambos. Eu prefiro não perder meu tempo em tentar entender, seria inútil. Acredito mesmo que o que vale a pena é curtir, quando é bom, é claro. Do contrário, melhor esquecer.
E o que fiz depois do sonho? Recordar! Estou até agora, escrevendo essas linhas, fazendo exatamente isso, recordando. O Bahia, ele mesmo, aquele time de grandes multidões, Bahia, o campeão dos campeões, foi o protagonista. Vi nos DVDs que adquiri a melhor forma de manter viva a chama do verdadeiro Esquadrão de Aço. O que restou dele é isso que temos hoje, que nem de longe lembra o Bahia dos tempos áureos.
Essa viagem ao passado começou na tentativa – mais uma – de convencer minha filha a conhecer um pouco do meu time. Ela, que por tantas vezes questionou o porquê dessa paixão, resolveu ceder novamente e assistiu comigo alguns dos DVDs. A cada jogo, lance, gols, vitórias e derrotas eu tentava explicar esse sentimento visceral que une mais de cinco milhões de fanáticos. Todos os grandes jogadores que eu vi estavam presentes e, um a um, eu fazia minha análise. Léo Oliveira, Osny, Jésum, Beijoca, Gilson Gênio, Marinho Apolônio, Leandro, Claudio Adão, Charles, Paulo Rodrigues, Zé Carlos, Marcelo Ramos e o maior de todos, Bobô.
Ela olhava atentamente, sem entender minha empolgação, é verdade, mas alegre por me ver naquele estado de transe total. Iniciamos nos anos 80 e fomos até o final dos 90. E foi aí que lembrei de um detalhe importante: em idos 1988, mais ou menos nessa mesma época do ano, estávamos na caminhada mais importante da nossa história, a do título brasileiro.
Lá se vão vinte anos, mas parece que foi ontem. Depois de tanto tempo, ouvir de novo Galvão Bueno dizer “O Bahia é campeão brasileiro!”, ao final da partida decisiva contra o Inter, é algo indescritível, arrepiante! Ver a imagem de Ronaldo erguendo as mãos e discretamente agradecendo a conquista, maltratou meu velho coração. A essa altura meus olhos já marejavam e num súbito, as lágrimas escorreram. Eu já não me importava com nada. Minha filha, também emocionada e incrédula – sim, porque até aquele momento ela não acreditava que o meu Baêa já havia sido campeão brasileiro -, me fez uma pergunta que deixou o silêncio reinar por alguns instantes: “Por que o Bahia chegou nessas condições, meu pai? Série C, agora a B…”.
Saindo do estado de letargia ao qual fui submetido depois do questionamento dela, continuei minha viagem por 88. A resposta eu tentaria dar depois. A viagem de volta, a chegada ao aeroporto, o desfile dos heróis pelas ruas e a peregrinação dos fiéis tricolores, alguns chorando, outros gritando, tudo o que envolveu aquela conquista é motivo de orgulho.
Ninguém acreditava que um time com Tarantini, Sales Cabeção, Edinho Jacaré, Sandro, Gil Sergipano, Claudir e João Marcelo no elenco fosse fazer boa campanha. Nem o mais otimista imaginaria tal feito. Vínhamos de um tri-campeonato regional, mas para fazer frente no brasileiro não tínhamos esperanças, pelo menos eu não. O problema é que no banco o velho Evaristo fazia diferença, mesmo com toda birra. Ele tirava leite de pedra, e foi exatamente isso que conseguiu com aquele grupo.
Havia os diferenciados: Zé Carlos, Pereira, Paulo Robson, Paulo Rodrigues e Charles. E um excepcional: Bobô. Juntando tudo, fez-se o time campeão. Não concordo com as palavras de Evaristo, dizendo que era um time de merda, mas não era o que podemos chamar de timaço. O que sei de verdade é que eles fizeram a alegria de uma nação, e mais ainda, colocaram inveja nos sofredores do vice, o que pra nós é um deleite.
Difícil encontrar uma resposta condizente para a pergunta de Kelly. O fato é que o título de 88 foi o divisor de águas. De lá pra cá, conseguimos algumas campanhas boas, como as de 90, 94, 99, 00 e 01. Mas os revés foram maiores. Perdemos a hegemonia estadual e vimos o vice conseguir o primeiro tri e tetra da sua existência. Sofremos com três rebaixamentos e chegamos ao fundo do poço, a terceira divisão. Se perguntar o que de mais importante aconteceu nesses vinte anos, a resposta será a mesma: o gol de Raudinei. E o mais triste é que nos tornamos um time sem porvir.
Não, não vou escrever sobre as agruras que vêm nos perseguindo todos esses anos. Vou dar espaço às minhas memórias, que andam tão em baixa. Se recordar é viver, então, estou vivendo e sendo um pouco mais feliz, nem que seja só por hoje.
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