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Publicada em 19 de dezembro de 2006 às 00:00 por Autor Genérico

Autor Genérico

Entre o sonho e a realidade

Por vezes sirvo-me de imagens e fantasias, do quase irreal, preocupado tão somente com a eficácia, e não pelo gosto do mistério tão vivo nas pessoas, que me faz pensar no seguinte diálogo dos Irmãos Marx:

– Olha, há um tesouro na casa ao lado.

– Mas não há nenhuma casa aqui ao lado.

– Então construiremos uma!

Pois é, quando o momento é de recesso e as boas notícias são as festas do Natal e Ano Novo, tento divagar um pouco para entender a tragédia que se abateu sobre o Bahia e, paradoxalmente, a alegria que tomou conta dos colorados. Fico alegre pelo fato de ser brasileiro e neste momento um pouco colorado, mas não quero divagar sobre a tragédia do tricolor baiano onde tudo é tristeza, confusão e desentendimento. Prefiro lembrar a consciência dos homens, segundo Ivanovitch Gurdjieff…

Para compreender a diferença entre os estados de consciência é necessario voltar ao primeiro, que é o sono. É um estado de consciência subjetivo. O homem mergulha nos seus sonhos pouco importando que deles conserve ou não a recordação. Mesmo se algumas impressões reais atingem o homem adormecido, tais como calor, frio, sons, vozes, sensações do seu próprio corpo, elas só despertam nele imagens fantásticas. Depois o homem acorda…

Ao acordar, a primeira vista é um estado de consciência completamente diferente. Ele pode mover-se, falar com outras pessoas, fazer projetos, ver perigos, evitá-los etc. Parece razoável pensar que se encontra numa situação melhor do que quando dorme. Mas se vermos a coisa um pouco mais a fundo, se lançarmos um olhar no seu mundo interior, às causas das suas ações, compreenderemos que está quase no mesmo estado que quando dorme…

É uma máquina, tudo lhe acontece. Não pode fazer parar a vaga dos seus pensamentos, não pode controlar a imaginação, as suas emoções, a sua atenção, as vaidades. Vive num mundo subjetivo de “eu gosto”, “não gosto”, “isto agrada-me”, “aquilo não me agrada”, “quero”, “não quero”. Quer dizer, um mundo daquilo que julga gostar ou não gostar, querer ou não querer. Não vê o mundo real.

O mundo real está-lhe vedado pelo muro da própria imaginação. Ele vive dormindo, e aquilo que chama a sua “consciência lúcida” não é mais que sono, um sono muito mais perigoso que o seu sono da noite, na cama.

Consideremos qualquer acontecimento na vida da humanidade, por exemplo, a guerra. Há guerra neste momento. O que quer isto dizer? Isto significa que vários milhares de adormecidos esforçam-se para destruir vários milhares de outros adormecidos. Recusar-se-iam a isso, evidentemente, se despertassem. Tudo o que atualmente se passa é devido a esse sono.

Estes dois estados de consciência, sono e estado de vigília vulgar, são tão subjetivos um como o outro. Só quando começa a recordar-se de si é que o homem pode na verdade despertar. Em seu redor toda a vida adquire então um aspecto e um sentido diferente. Apenas o despertar e o que leva ao despertar pode ter um real valor.

O que é necessário para despertar esse homem adormecido? É necessário um bom choque. Mas quando um homem está profundamente adormecido, um único choque não é suficiente. Um longo periodo de choques incessantes torna-se necessário. Por consequência é preciso alguém para administrar esses choques. Há também a possibilidade de despertar por processos mecânicos, pode-se usar um despertador. A desgraça quer que nos habituemos depressa demais a qualquer despertador. Deixaremos de ouví-lo, muito provavelmente.

São por tanto necessários vários despertadores, com campainhas diferentes. E aqui surgem mais dificuldades, os despertadores precisam de corda; para lhes dar corda é preciso lembrar-se, e para lembrar-se é preciso acordar várias vezes. Mas eis o pior: um homem habitua-se a todos os despertadores e, após um certo tempo ainda dorme melhor! É preciso inventar outros modelos. É muito mais provável que ao recomeçar esse trabalho de inventar novos modelos e novas formas de dar corda ele volte a adormecer, e como digo, dormirá cada vez melhor. É uma questão de hábito.

Portanto, para despertar é preciso uma conjunção completa de esforços. É indispensável que haja alguém para despertar o adormecido; é indispensável que haja alguém para vigiar aquele que acorda; é necessário ter despertadores, e é igualmente necessário inventar cada vez mais, novos modelos. Mas para levar a bom termo tal empreendimento e obter bons resultados devem trabalhar várias pessoas em conjunto.

Falar de sono, sonho e realidade, é um pouco difícil para quem pretende entender mentes confusas e adormecidas, paradas no tempo portanto. Por exemplo: não mais que de repente, como se estivesse sonhando, vejo o Internacional jogando do outro lado do mundo e sendo campeão mundial contra o estrelado Barcelona… Há cerca de dezoito anos o Bahia jogava contra o mesmo campeão mundial de agora, em Porto Alegre (Beira-Rio) e se sagrava campeão do Brasil com todos os méritos.

Onde está o Bahia? O Internacional, todos sabemos onde está. Quem dormiu e está sonhando o pior dos sonhos?… Desculpem-me se estive muito metafórico para vossos gostos, mas é Natal, tempo de compreensão.

XXX

Desejo que todos tenham um Natal Feliz e um Ano Novo cheio de paz e glória, que a prosperidade seja a tônica… que os homens acordem e se entendam. Que o nosso Bahia encontre o caminho para uma nova Aurora… Auroras existem mas é preciso acordar sempre, para vê-las!!

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