Acabou o Campeonato Baiano de 2008. Esse começou em janeiro, mas nada do que aconteceu até abril serviu de alguma coisa: só valeu mesmo o quadrangular final. Constatei agora que isso era o que estava escrito no regulamento bolado pela FBF e aprovado pelos clubes disputantes.
Não acompanhei de perto toda a seqüência de jogos inúteis nem a de jogos que podem ter sido, de alguma forma, úteis. Por isso, me abstenho de tecer comentários sobre esquemas, escalações, desempenho do técnico e jogadores, etc.
Passei a maior parte desses meses viajando pelo exterior de férias ou a trabalho. Agora que já tenho um dinheirinho que me possibilita, nas férias, optar entre pegar o Ferry Boat pra ir acampar na ilha ou ir para a Europa, eu me sacrifico sempre e vou pro Velho Continente (ficou meio pedante isso aí, mas não vou me retratar – os ilhéus que me desculpem). Também por opção pessoal, não tive acesso ao vasto material noticioso sobre o Bahia que, como vocês sabem, sai todo dia nos jornais europeus como o Le Monde, El País, Corriere della Sera, Gazzetta dello Sport, Frankfurter Allgemeine, Daily Telegraph isso só pra falar dos jornais escritos em língua legível, e não naqueles transcritos na língua do planeta Klingon, como os da República Tcheca e Hungria (hoje estou insuportável!).
Mas quem disse que eu consegui me desligar totalmente do Bahia nesse alheamento geográfico? Nas vezes que eu mantinha contato telefônico com um dos meus filhos, que está estudando lá na Espanha, ele tratava logo de ir me pondo a par do desempenho surpreendente do time do Bahia no campeonato. Até dois BAvis seguidos o Bahia tinha ganho! Para ele, eram favas contadas a conquista do campeonato. Eu não queria nem saber, não compartilhava a mesma euforia, mas deixava ele saborear a ilusão.
De volta ao Brasil, fui enviado a trabalho aos Estados Unidos e tive que fazer das tripas coração para não ver o noticiário das TVs locais sobre o Bahia como você sabem, o futebol (soccer) baiano ocupa grande parte do noticiário televisivo do Tio Sam, assim como aqui na Globo e afins. Desse modo, escolhi ficar mais uma vez completamente alienado. Confesso que foram dias alegres.
Quando finalmente regressei de vez ao Brasil, cheguei no exato momento em que tinha acabado o segundo BAvi no Barradão. Minha mulher quis ligar o rádio do carro para saber quanto tinha sido o jogo. Bloqueei o impulso dela, pois nem mesmo quis olhar o Barradão do avião, quanto mais saber o resultado do jogo num momento em que queria aproveitar a estadia em casa após longa ausência. Mas ao abrir a porta do elevador me deparei com meu sobrinho André, todo risonho, e ele entregou logo o resultado de 4×1 pro Bahia. Fiquei feliz, claro, mas, como não tinha visto o jogo, pareceu-me coisa ficcional, algo meio irreal.
Só a partir desse jogo é que passei acompanhar o campeonato à vera. Podem ir logo me culpando, pois a seqüência de resultados vocês já sabem e eu tava aqui assistindo tudo. Porém, para advogar em meu favor, gostaria de evocar o meu total desconhecimento do regulamento desse quadrangular. Para piorar, ouvi no rádio e na TV que o campeonato poderia ser decidido no carimbo ou moça (cara ou coroa, para os menos avisados). Fiquei naturalmente estupefato!
Que diabos de regulamento era esse que fazia o time com melhor campanha jogar a primeira e a última partida com o segundo melhor colocado, enquanto o terceiro colocado jogava com o time de pior classificação nessas mesmas rodadas e com o último jogo em seus domínios? Que diabos de regulamento era esse que previa só uns três ou quatro critérios técnicos de desempate, todos relativos apenas ao quadrangular final, e depois disso apontava o sorteio para decidir o campeão? Mas será o Benedito?
Será que quem escreveu esse regulamento sabe tocar berimbau? Será que quem aceitou esse regulamento sabe batucar um tambor? A criatividade dessa gente se negou a pensar em mais um ou dois criteriozinhos? Carimbo ou moça…? Que é isso, minha gente? Será que nós, baianos, temos mesmo o pendor de nos tornarmos chacota nacional? Se é assim, se é pra esculhambar logo, deveriam ter incluído como último critério de desempate, por exemplo, que seria campeão aquele clube que tivesse um jogador com nome de um mamífero desdentado no time! Seria bem mais adequado ao tom geral do regulamento.
Tudo isso tem tom de choro, eu sei. E não é pra menos. Pois mesmo não tendo estado envolvido com a maior parte desse campeonato baiano, que já reputei anteriormente como de pouca relevância, a disputa local ainda consegue despertar velhas paixões e é sempre bom ganhar. Pior é não ser campeão e ainda dar o título ao rival. Alguns se consolam com isso, ou com o espírito de luta demonstrado pelo time do Bahia nesse último jogo contra o Vitória da Conquista e, até mesmo, se regozijam com a idéia de ter, até o último minuto, deixado atarantado o helicóptero encarregado de levar a taça ao estádio em que sairia o campeão. Eu não.
Em tempo, devo esclarecer, sobre a pilhéria berimbalística, que não levo o menor jeito pra tocar berimbau acho difícil pacas! Também não sei fazer batuque nenhum. E, para piorar a minha situação, ainda sou médico e baiano, coisas que foram ditas como incompatíveis pelo douto Coordenador do Colegiado de Medicina da UFBa. Creio que vou ter que renunciar à profissão que venho exercendo há quase 30 anos, porque fui desmascarado! Não levo jeito pra coisa, segundo o expert em baianidade médica ou medicalidade baiana! Devo ser um charlatão em pleno exercício ilegal da Medicina. Desculpem-me os pacientes fiéis de todos esses anos. Desculpem-me os leitores. Vou fugir envergonhado. Levarei comigo para o exílio os autores do regulamento do Campeonato Baiano de 2008. Eu mereço sofrer. Vocês não.
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