O medo pode ser algo instintivo, é um sentimento natural, que denota uma certa descarga de adrenalina frente a um perigo ou uma meta a ser superada. Quando o medo se converte em um sentimento de retração ou de fuga, seu nome muda para covardia. Segundo o Michaelis on line, seu significado, no que concerne ao tema deste texto, é: “comportamento que revela fraqueza de espírito, falta de coragem e medo; cagaço”. Dentre grandes pensadores da era contemporânea, Gandhi asseverou que “o medo tem alguma utilidade, mas a covardia, não”; o Papa Bergoglio, vulgo Chico de Almagro, disse, em janeiro deste ano, que “não se pode viver uma vida cristã sem olhar para o futuro com esperança” e que “não fiquemos ali, parados, pois isso não nos fará crescer”. Dos filósofos um tanto dazantiga, Mark Twain disse certa vez que “coragem é resistência e domínio – e não ausência – do medo”. Finalmente, retrocedendo mais ainda no tempo, Aristóteles, com seu slogan “a virtude está no meio”, derivou seu pensamento ao asseverar que existe um equilíbrio entre a temeridade afoita e a pura covardia. Quando o medo do sucesso supera o potencial do indivíduo, não é apenas covardia, como também autossabotagem: é o que temos visto da parte do Bahia dentro de campo.
Neste diapasão, peço desculpas ao leitor ansioso por busca de soluções técnicas para o ataque inoperante, a defesa lenta e para o paradoxal e pasmacento Guerra que não agride ninguém pelo time do Bahia. Ao leitor que deseja ensaios táticos sobre como – de uma hora para outra – o time tão decantado pela imprensa sudestina como sinônimo de marcação e contra-ataque perdeu e empatou importantes partidas dentro de casa, na verdade não parece haver nenhuma explicação sensata.
Teorias conspiratórias pululam pelas redes e blogs/vlogs especializados, por exemplo, de que estaria faltando bicho ou eventuais atrasos salariais. Caso isso esteja acontecendo de fato, não apenas desmorona a imagem de retidão da atual diretoria, como também revelaria um elenco que não possui identificação com a torcida – até mesmo porque, em caso de atrasos, os jogadores poderiam, eventualmente, mostrar-se mais reivindicativos e certamente a torcida estaria do seu lado caso correspondessem em campo.
A segunda teoria é de que “o clima no grupo está ruim”, o que não tenho observado de fato. Caso seja verdade, falta pulso a quem de direito no sentido de controlar a crise.
Uma terceira teoria é de que “o Bahia chegou no seu limite técnico e agora tende a voltar ao seu padrão de normalidade”, como se o elenco tricolor fosse uma curva Gaussiana inerte sem o menor poder de reação. Decerto, acontecem certos “milagres” no futebol, o que se convenciona por “boa fase” ou “auge”, como Nino Paraíba jogar bola em alto nível; porém, acho pouco provável para um grupo que tem (ou tinha) nas mãos a oportunidade de entrar para a História do Bahia como o grupo que o levou para o Além-Tapobrana depois de trinta anos – implica mais do que na glória: também em muita grana e melhores contratos.
Enfim, o que está acontecendo com o Bahia? Em futebol, o sobrenatural acontece, mas não no sentido fantasmagórico; e sim, no sentido psicológico ou psicosférico. Não é de hoje que o nosso tricolor decepciona em momentos decisivos, por exemplo, as eliminações bizarras da Série B em 1999 e 2004; ou a perda do Nordestão para Ceará e Semáforo Sampaio Corrêa em plena Fonte Nova. Com a classificação ao G6 nas mãos, deixa-se escapar em atuações atabalhoadas, pouco ousadas e por vezes covardes. Não faz muito tempo que grandes clubes do underground ludopédico como Ipatinga, Fast Club-AM, CRAC, Ferroviário-CE e Extrato de Tomate Paulista de Jundiaí povoaram nossos maiores pesadelos dentro de campo. Por ora, só posso crer que o Bahia saiu das Séries alfabéticas Sub-A, mas estas não saíram do Bahia.
Em colunas anteriores, clamamos por mais ousadia, e parte dos nossos leitores interpretavam isto como um convite à prodigalidade financeira, o que não é verdade. De fato, no mercado da bola é muito complicado exigir um time de ponta, ainda mais com o Bahia ocupando o décimo quarto lugar em orçamento no Brasileirão. Contudo, diante do resultado dito “acima da média”, a impressão que temos é de um Bahia que diz à sua torcida “temos a maior campanha da história dos pontos corridos. Não se preocupem, tudo dentro do planejado”.
Clubes vencedores são ousados, partem para cima, superam seus limites. Cabe à diretoria e ao treinador passar isso para dentro de campo, e não utilizar lacônicas desculpas de “faltou algo a mais” e “atuamos com nervosismo”. Para que o Bahia continue a se autoproclamar como bicampeão brasileiro, é preciso mais do que “jogar com alma” contra o mesmo clube que vencemos fora de casa, com direito a elogios da bairrista imprensa gaúcha, em jogo recente na cidade de Porto Alegre.
Pelo retrospecto, pelo afunilamento técnico do Brasileiro (na reta final) e pela média de desempenho do Bahia (inclusive com um jogo-festa dificílimo em breve no Maracanã contra o virtual campeão Flamengo), a tendência é de não-classificação no G6 e de uma broxante classificação à Sulamericana cujo critério de admissão é tão somente não ser rebaixado. O que ocorrer fora disso será mais uma história do Improvável FC; mais um conto do Anedotário do futebol outrora pentacampeão do mundo, em tempos de 7×1 e celebridades facebookianas pueris que habitam a granja Comary. Pois é, Belintani, o Bahia gastou a alma toda que tinha contra o Grêmio lá na Copa do Brasil, de modo que virou uma forma ovóide em campo e nada mais tem feito. Por ora, só nos resta mais um campeonato baiano contra o rival da Cerei C…
Saudações Tricolores!
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