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Publicada em 13 de maio de 2008 às 00:00 por Autor Genérico

Autor Genérico

Ciência e Religião no Futebol

Muito se tem feito para dar conteúdo e ares científicos à preparação de um time de futebol. Foram conseguidos inúmeros progressos, indubitavelmente, no campo da preparação física, fisiologia do esporte, nutrição, métodos terapêuticos tanto clínicos quanto cirúrgicos, fisioterapia, reabilitação e, até mesmo, numa abordagem psicológica voltada para dar suporte e espírito vencedor aos jogadores. Tudo isso junto (devo estar esquecendo alguma coisa) é o que se está convencionando chamar “Ciência do Esporte”.

Deixei de fora, propositalmente, a seção da preparação técnica e tática do futebol. Para mim, essa está em descompasso com as outras áreas. Há algum tempo vimos, no Rio de janeiro, um congresso dos técnicos de futebol de várias partes do mundo, promovido pelo “cientista” Parreira. Parecia um congresso sério, com coffee break e tudo, onde, imagino, foram discutidas novidades como o sistema WM, o Ferrolho Suíço, o 4-2-4, o 4-3-3, o 3-5-2, o quadrado mágico, o losango ilusionista, etc. Não deve ter sido discutido o sistema 11-0, o preferido por todos os treinadores em atividade e que nenhum deles ousa revelar, nem tampouco o sistema “arrecua os harf pra evitar a catástri”. De resultado concreto mesmo, tivemos o nosso desempenho e eliminação vergonhosos na Copa de 2006.

Também recentemente, o técnico Vanderlei Luxemburgo – não sei se é assim que se escreve o nome dele, porque, do alto do seu pernosticismo, deve grafar o nome como Wan der Ley Lootchenbourgus – criou, com pompa e circunstância, um instituto sobre o futebol, que, coincidentemente, se chama Instituto Wanderley Luxemburgo – IWL (agora que olhei o site, acertei a forma atual que ele escreve o nome – quando jogador, era Vanderlei e pronto) e que fornece cursos de graduação, pós-graduação, cursos livres, PhD, preparação de churrasquinho de gato e o escambau. E ainda inclui, claro, o filé do Marketing Esportivo e curso de Agente FIFA. Como ainda é uma iniciativa recente, sem produto para ser avaliado, não se pode avacalhar mais do que tentei, irresponsavelmente, fazer.

Na última sexta feira eu estava zapeando os jogos inaugurais da Série B e vi um assistente técnico, creio que do Gama, portando um computador laptop e fazendo contínuas anotações durante a partida. Como ignorante no assunto, fiquei bastante curioso para saber quais os dados que estavam sendo assinalados: se eram uma versão eletrônica da “prancheta” de Joel Santana ou se eram de um software moderníssimo, state-of-the-art (estado da arte ou coisa atualizadíssima – quando Wanderley Luxemburgo aprender essa expressão vai se candidatar ao Prêmio Nobel de Física). O fato é que o Gama acabou tomando 2×0 e me deixou com a impressão que o tal software era mais inútil que o “Anjo da Guarda da família Kennedy”, como Fausto Silva costumava falar (faz mais de 5 anos que não assisto o Faustão – ele ainda está gordo, usa calça acima do umbigo e fala “orra meu”?).

Nosso software aqui no Bahia atende pelo nome de Beijoca. Foi meu ídolo como jogador, assim como de todos os tricolores que nasceram antes da construção, pelos holandeses, do Dique do Tororó. Não sei até que ponto Beijoca está contribuindo ou interferindo positivamente no time comandado pelo técnico Paulo Comelli. Depois que Beijoca aderiu a uma das confissões evangélicas que proliferam por aí, só fala nisso. E isso é chato pra dedéu! – pelo menos pra mim. Antes do jogo contra o Fortaleza, lá no estádio Jóia da Princesa, ele foi entrevistado por uma rádio e disse que estava conversando (coisas transcendentais provavelmente) com alguém do Fortaleza que ele tinha acabado de conhecer, mas que era seu “irmão em Cristo”.

Religião tem o seu lugar na vida íntima de cada um, mas no momento em que começa a se tornar uma obsessão, a se manifestar de maneira deslocada, sem senso de oportunidade, passa quase a ser problema psiquiátrico. Eu não vejo, por exemplo, no nosso meio, ninguém do Candomblé falando no rádio, antes de um jogo de futebol, que vai cumprimentar outro e trocar uma idéia porque também é filho do Oxóssi. Isso é uma coisa particular, que só diz respeito aos envolvidos, e não deve ficar sendo propalada aos quatro ventos. Não acho uma coisa producente.

Além do mais, tira o foco, a meu ver. O futebol é, por si, uma religião em particular. Tem todos os elementos que vão da fé cega e fervor ao fanatismo. Assim, Beijoca deveria estar mais preocupado em prestar seus serviços ao Bahia ao estudar previamente a escalação e disposição tática do Fortaleza, repassar essas informações para Comelli, insuflar o grupo com sua experiência de ex-jogador raçudo e limitar suas declarações e ações profissionais a isso. O mesmo raciocínio vale para os “atletas de Cristo”, “I belong to Jesus”, “Deus é fiel”, idas ao Bonfim, incorporação de corpos estranhos, místicos e congêneres. Parafraseando João Saldanha ou Neném Prancha, se religião ganhasse jogo, Campeonato Baiano terminava empatado.

Essas minhas considerações podem muito bem ser interpretadas pelos imbecis de plantão como intolerância religiosa, preconceito, discriminação e afins. Se isso acontecer, não estou preparado para me defender, porque só sei argumentar com quem pensa. O que estou tentando dizer é que misturar religião com futebol pode até ser uma coisa bem intencionada, mas é uma coisa insensata e simplória. Imaginar que existe um ser superior comandando as coisas, que vai fazer prevalecer um time sobre outro, um atacante sobre o goleiro ou vice-versa, é colocar esse ser superior em condição rasteira – sem nada de superior.

Não pensem que estou aqui demonizando ou querendo diminuir o nosso Beijocão (até porque lembro bem da força do seu gancho de esquerda). Depois da partida contra o Fortaleza, ele mesmo caiu na real e reconheceu que faltou empenho aos jogadores, faca nos dentes, etc. Só exemplifiquei esse episódio dele antes do jogo para poder tratar conjuntamente dos temas Ciência e Religião no futebol. Nem estou tentando dizer que os problemas do Bahia estão relacionados a esse tipo de postura. Muito longe disso. O nosso problema é técnico. Nossos jogadores não têm técnica. Alguns, como Ávine, enganam os bestas por causa da habilidade a la Denílson, mas não possuem técnica nenhuma. Não sabem cruzar nem chutar em gol. Chegam na cara do goleiro e perdem o tempo da bola dando um toque a mais, fazem pose e erram o alvo. Ananias e Elias são uma bela rima, mas não são a solução (desculpe Drummond!). Reinaldo Aleluia é mais uma referência religiosa que eu não gostaria de continuar tratando aqui. O técnico Comelli demonstra na maior parte do tempo de jogo um semblante tipo “que porra é que eu tou fazendo aqui?”

Pois continuo batendo na mesma tecla: Paulo Comelli, sabe o que é que você, como técnico, deveria estar fazendo aqui? Tentando dar técnica aos jogadores! O elenco é fraco? É. Mas se vire, cara! Eu gosto muito da postura de Comelli de evitar fazer os inúteis treinos coletivos. Entretanto, em troca, deveria manter os atletas fazendo treinos de conclusões a gol (com a bola em movimento) até de madrugada, como o jogador de basquete Oscar fazia para chegar à excelência nos seus arremessos de três pontos; deveria fazer uma estatística (em computador ou prancheta) dos diversos parâmetros técnicos dos jogadores durante as partidas, para reforçar suas qualidades e trabalhar exaustivamente suas deficiências. A Ciência do futebol é simples, mas não se pode prescindir dela. Vamos colocar um pouco de Ciência na preparação do time e confiar que, no fim, os céus sempre irão privilegiar aqueles jogadores e equipes que estiverem mais bem treinados e preparados.

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